Primeiro disco de Djavan como intérprete, Ária dá ar rarefeito ao canto habilidoso do artista, que se exercita como crooner com a maturidade que ainda não pautava sua voz nos anos 70, década em que Djavan gravou temas alheios para trilhas sonoras de novelas da TV Globo e cumpriu expediente noturno em boates do Rio de Janeiro (RJ) enquanto procurava sedimentar sua obra autoral no mercado fonográfico. Produzido e arranjado pelo próprio Djavan, Ária transita intencionalmente na contramão estilística dos bissextos registros emotivos em que Djavan se aventurou como intérprete quando já era compositor de forte personalidade autoral - notadamente Sorri (Charles Chaplin em versão de Braguinha) e Correnteza (Tom Jobim e Luiz Bonfá), grandes faixas de seu álbum Malásia (1996).
Já na primeira faixa de Ária, Disfarça e Chora (Cartola e Dalmo Castello), salta aos ouvidos a ambiência cool do álbum. Munido apenas de sua voz e de seu violão, Djavan repagina o samba em tons sofisticados com a mesma rala dose de emoção que pauta o abolerado samba-canção Sabes Mentir (Othon Russo), extraído do cancioneiro folhetinesco de Ângela Maria, símbolo da influência materna na escolha afetiva das 12 músicas que formam o repertório de Ária. Entre o banal (Palco, sem o clima festivo deste clássico de Gilberto Gil) e o sublime (Brigas Nunca Mais, o samba de Tom & Vinicius retocado no compasso de valsa), o crooner Djavan brilha ao fazer sua sincopada Apoteose ao Samba (Mano Décio da Viola e Silas de Oliveira), ao voar em céu de brigadeiro pela reconhecível rota melódica de Fly me to the Moon (Bart Howard), ao desvendar a beleza ainda oculta em Luz e Mistério (Beto Guedes e Caetano Veloso) e ao apresentar ao Brasil um (belo) tema espanhol mais contemporâneo, La Noche (Enrique Heredia Carbonell e Juan Jose Suarez Escobar), pinçado do repertório da cantora Montse Cortez.
Em contrapartida, Djavan apenas bate ponto como crooner ao diluir a densidade da Valsa Brasileira (Chico Buarque e Edu Lobo) e ao fazer sua Oração ao Tempo (Caetano Veloso) com a percussão divina de Marcos Suzano. Entre mais acertos do que erros, o registro em scats de Treze de Dezembro (Luiz Gonzaga e Zé Dantas) reitera o tom rarefeito de Ária, disco que confirma a rara habilidade de Djavan como crooner sem oferecer o que se espera do (esperado) primeiro disco de intérprete do compositor.
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